Os Intrusos

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  Todos os animais possíveis e imagináveis que viviam naquele bosque: esquilos que brincavam entre os ramos, lobos à espreita de veados, pardais que cuidavam das suas crias, peixes e rãs que conviviam no lago, ursos, ouriços, texugos, raposas…   … Continuar a ler

Saïd, o rapaz do lampião

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Toni estava saturado de andar às voltas no templo de Karnak, no meio do grupo de turistas.

As sandálias, cheias de areias e de pequenas pedras, feriam-lhe os pés, e a mãe tinha-o obrigado a vestir calções e a calçar peúgas. Para cúmulo, tinha ainda de usar um chapéu de palha de aba larga, para se proteger do sol. Tanto ele como a mãe eram os únicos na família que tinham aquela cor delicada, muito branca, herdada de um antepassado caucasiano longínquo. Toni sentia-se ridículo vestido daquela forma.

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A maçã verde

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Este é o meu segundo dia na minha nova escola, no meu novo país.
Hoje não vai haver aulas porque vamos para o exterior. Mas os outros dias não serão como este. Amanhã voltarei para a aula em que irei aprender a falar Inglês.
As mães conduzem-nos para um atrelado cheio de feno. Subimos e encostamo-nos aos fardos de feno. O carro é puxado por um trator e todos somos sacudidos de um lado para o outro.
Acho estranho haver rapazes e raparigas sentados, juntos. No meu país não era assim.
Os alunos conhecem-se uns aos outros, mas não me conhecem a mim e eu não os conheço a eles. Quando falam não consigo percebê-los, e eu não posso ainda falar com eles. Alguns são amigáveis. Mas outros olham friamente para mim e sorriem, desdenhosos. Continuar a ler

Novos destinos – o mesmo drama

Enquanto a União Europeia fecha as portas à emigração africana, uma nova vaga tenta a sua sorte na América Latina. Africanos podem levar mais de 30 difíceis dias a atravessar o Atlântico para chegar ao Brasil, Argentina ou México. Nos últimos dois anos, os números da imigração duplicaram, assim como os pedidos de estatuto de refugiado.

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As Crianças Lambem o Prato

Quer se trate de populações cujo fraco poder de compra não lhes permite o acesso aos víveres vendidos no mercado ou pessoas cujo estatuto social as torna desprezadas pelas sociedades em que estão inseridas, um elevado número de seres humanos está votado à eliminação ao longo dos próximos anos. Mas ninguém reconhecerá abertamente que “programou” a eliminação pela fome, pelo massacre ou pela deportação daqueles que os incomodam.  Continuar a ler

O remedeio

aCatarina torceu o pé na aula de ginástica. Agora tem de usar uma ligadura e coxeia. O facto não é só desagradável para ela. É desagradável para toda a turma porque Cati devia dançar na festa da escola, no parque. O brilhante número da turma do quarto ano está em perigo.
— Que azar! — disse Jacob. — Isto tudo só porque a Cati não quis deixar de ir à aula de ginástica! Nenhuma estrela de dança vai fazer ginástica antes da festa da escola. Devíamos tê-la proibido!
— A Susi pode dançar por ela — propõe Max.
— Eu? — exclama Susi. — Agora assim, de repente? Vocês queriam a Cati! Ela é que não devia ter torcido o pé! Continuar a ler

Tensões étnico-políticas – A Europa no Rescaldo da Segunda Guerra Mundial

Tensões étnico-políticas
A Europa no Rescaldo da Segunda Guerra Mundial

Nas suas memórias do final dos anos 40 e dos anos 50 do século XX, publicadas depois da sua morte na sequência do famoso «assassinato do chapéu-de-chuva», em Londres, no ano de 1978, o escritor dissidente búlgaro Georgi Markov contava uma história emblemática do período do pós‑guerra – não só do seu país mas da Europa como um todo. Envolvia uma conversa entre um dos seus amigos, que tinha sido preso por confrontar um funcionário comunista que tinha passado à frente na fila do pão e um oficial da milícia comunista búlgara:

«E agora diz-me quem são os teus inimigos?», perguntou o chefe da milícia.

K. pensou durante algum tempo e respondeu: «Não sei, acho que não tenho inimigos.»

«Não tens inimigos!» O chefe levantou a voz. «Estás a querer dizer que não odeias ninguém e que ninguém te odeia?»

«Tanto quanto sei, ninguém.»

«Estás a mentir!», gritou, de súbito, o tenente-coronel, levantando-se da sua cadeira. «Que tipo de homem és tu, se não tens inimigos? Claramente não pertences à nossa juventude, não podes ser um dos nossos cidadãos, se não tens inimigos!… E se, de facto, não sabes como odiar, ensinar-te-emos! Ensinar-te-emos muito depressa!»

Em certo sentido, o chefe da milícia desta história tem razão – era praticamente impossível emergir da Segunda Guerra Mundial sem Continuar a ler

Limpeza Étnica – A Europa no Rescaldo da Segunda Guerra Mundial

Limpeza Étnica

A Europa no Rescaldo da Segunda Guerra Mundial

A Segunda Guerra Mundial nunca foi um mero conflito por território. Foi também uma guerra de raça e etnicidade. Alguns dos acontecimentos que definiram a guerra em nada se relacionavam com a conquista e a manutenção de terrenos físicos, mas com a imposição de um determinado selo étnico num terreno já detido. O Holocausto judeu, a limpeza étnica do Oeste da Ucrânia, a tentativa de genocídio dos sérvios croatas: tais acontecimentos foram levados a cabo com um vigor tão ardente quanto o da guerra militar. Um grande número de pessoas – talvez 10 milhões ou mais – foram deliberadamente exterminadas sem outro motivo que não o facto de pertencerem ao grupo étnico ou racial errado.

O problema para os que procuram esta guerra racial reside no facto de nem sempre ser fácil definir a raça ou etnicidade de uma pessoa, em especial na Europa de Leste, onde diferentes comunidades estavam, muitas vezes, inextricavelmente entrelaçadas. Os judeus que, por acaso, tinham cabelo louro e olhos azuis podiam escapar porque não se enquadravam no preconceituoso estereótipo racial nazi. Os ciganos podiam disfarçar-se como membros de outros grupos étnicos, e faziam-no, bastando mudar a roupa e os comportamentos – o mesmo acontecendo com os eslovacos na Hungria, os bósnios na Sérvia, os romenos na Ucrânia e por aí fora. A forma mais comum de identificar os amigos ou inimigos étnicos – a língua por eles falada nem sempre se mostrava um indicador seguro. Aqueles que tinham crescido em comunidades mistas falavam várias línguas e podiam saltar entre uma e outra, dependendo da pessoa com quem estavam a falar – uma habilidade que terá salvo muitas vidas durante os dias mais sombrios da guerra e do seu rescaldo. Continuar a ler

O maltrato subtil

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O maltrato subtil

Num qualquer dia, numa qualquer cidade, num qualquer país, nasceu uma linda menina, cujos olhos maravilhosos observavam tudo em redor.

Quando começou a andar pela cidade, as pessoas disseram-lhe que, para ser bonita, tinha de usar vestidos bonitos. E ela deixou de se sentir bonita quando não tinha posto um vestido bonito.

Quanto à cor da pele, aconselharam-na a mudá-la, para ser mais bonita, e ensinaram-na a maquilhar-se. A partir desse dia, a menina nunca mais se sentiu bonita se não estivesse maquilhada.

Outro reparo que lhe fizeram foi relativo à altura. Se não fosse mais alta, não seria bonita. A menina começou, então, a usar saltos altos, com grande sacrifício. Aliás, se não calçasse sapatos de tacão, sentia-se sempre baixa e insignificante.

Claro que para ser bonita tinha de ser magra. Assim, nunca mais pôde comer aquilo de que gostava sem se sentir sempre culpada.

E também lhe falaram do cabelo, da cintura, do peito. Deste modo, a menina começou a sentir-se tão feia que todos os dias despendia mais tempo e fazia mais sacrifícios para se sentir um pouco mais bonita.

Acabou por estragar a pele por causa da maquilhagem diária, por deformar os pés por causa dos saltos altos, que usava constantemente, e por ficar debilitada para poder continuar magra segundo os padrões que lhe exigiam.

Tinham-lhe ensinado a não gostar de si como era e a usar sempre artifícios para ser digna do apreço dos outros.

Até que chegou o dia em que começou a ter medo de que os outros descobrissem como era realmente. Sentindo-se feia, apaixonou-se por um rapaz que a tratava como se não fosse digna dele, atitude que ela achou normal. Sentindo-se feia e sem conseguir aceitar-se, passou a permitir que a maltratassem.

Nunca te esqueças de que a verdadeira beleza é uma atitude, e de que és sempre uma pessoa lindíssima quando és autêntica.

Diego Jiménez

 

LYDIA CACHO e a luta pela liberdade

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 “O jornalismo está em liberdade condicional.”

Jornalista, feminista, escritora e defensora dos direitos humanos, Lydia Cacho é especialista em temas de género e violência na UNIFEM (Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher). Cofundadora da Rede de Jornalistas do México, Centro-América e Caraíbas, é ainda, atualmente, fundadora e diretora do Centro de Atendimento Externo para Mulheres Maltratadas em Cancun, CIAM. Foi galardoada com os prémios Human Rights Watch 2007, o Prémio Mundial UNESCO para a Liberdade de Imprensa, Guillermo Cano – 2008 e, no mesmo ano de 2008, também recebeu o Prémio Liberdade de Expressão, da União de Jornalistas de Valência.

Em 2006, conheci Lydia, na Cidade Juárez, enquanto preparava a viagem ao México com a Plataforma das Mulheres Artistas, para denunciar os crimes contra as mulheres. Já antes dessa viagem, tinha estado em contacto com ela, e juntas planificámos todas as ações a levar a cabo no México. Recordo o primeiro encontro, na Casa de Espanha, e nunca esquecerei aqueles seus olhos cheios de vida e de doçura, nem aquela energia que me uniu a ela para sempre. Senti como se de minha irmã gémea se tratasse, como sei que sentem muitíssimas mulheres às quais foi devolvida a valentia e a força para seguirem em frente, particularmente as da Casa de Acolhimento que dirige, com uma metodologia baseada no amor e no Continuar a ler

Sugestões de leitura para adultos – edições brasileiras

A Garota Que Você Deixou Para Trás

Jojo Moyes
Intrínseca, 2014

Jojo Moyes apresenta a comovente história de duas jovens separadas por quase um século no tempo,mas juntas em sua determinação de lutar por aquilo que amam – custe o que custar.

Durante a Primeira Guerra Mundial, o jovem pintor francês Édouard Lefèvre é obrigado a se separar de sua esposa, Sophie, para lutar no front. Vivendo com os irmãos e os sobrinhos em sua pequena cidade natal, agora ocupada pelos soldados alemães, Sophie apega-se às lembranças do marido admirando um retrato seu pintado por Édouard. Quando o quadro chama a atenção do novo comandante alemão, Sophie arrisca tudo – a família, a reputação e a vida – na esperança de rever Édouard, agora prisioneiro de guerra.

Quase um século depois, na Londres dos anos 2000, a jovem viúva Liv Halston mora sozinha numa moderna casa com paredes de vidro. Ocupando lugar de destaque, um retrato de uma bela jovem, presente do seu marido pouco antes de sua morte prematura, a mantém ligada ao passado. Quando Liv finalmente parece disposta a voltar à vida, um encontro inesperado vai revelar o verdadeiro valor daquela pintura e sua tumultuada trajetória. Ao mergulhar na história da garota do quadro, Liv vê, mais uma vez, sua própria vida virar de cabeça para baixo. Tecido com habilidade, A garota que você deixou para trás alterna momentos tristes e alegres, sem descuidar dos meandros das grandes histórias de amor e da delicadeza dos finais felizes.


1A bibliotecária de Auschwitz

Antonio G. Iturbe
Nova Fronteira, 2013

Muitas histórias do horror e sofrimento testemunhados dentro dos campos de concentração nazistas são contadas e recontadas, já estão gravadas e arquivadas. É difícil, nesses relatos, encontrar atos de esperança e força diante de todo o mal registrado durante o Holocausto.

A Bibliotecária de Auschwitz é um livro diferente. É uma história verdadeira e cheia de detalhes a respeito de um professor judeu, Fredy Hirsh, que criou uma escola secreta dentro do bloco 31, no campo de concentração de Auschwitz, dedicando-se a lecionar para cerca de 500 crianças. Criou também uma biblioteca de poucos volumes com a ajuda de Dita Dorachova, uma menina judia de 14 anos que se arriscava para manter viva a esperança trazida pelo conhecimento e escondia os livros embaixo do vestido. É um registro de uma época sofrida da história, mas que também mostra a coragem de pessoas que não se renderam ao terror e se mantiveram firmes usando os livros como “arma”.


últimos-dias-de-nossos-pais-jOs últimos dias de nossos pais

Joël Dicker
Intrínseca, 2015

Após a frustração de ter tido o Exército britânico encurralado em Dunquerque, Winston Churchill tem uma ideia capaz de mudar o curso da guerra: a criação de uma nova seção do serviço secreto britânico, a SOE (Executiva de Operações Especiais), responsável por conduzir ações de sabotagem e se infiltrar nas linhas inimigas. Algo jamais feito na história. Na esperança de se juntar à Resistência, o jovem Paul-Émile deixa Paris e vai para Londres. Logo recrutado pela SOE, ele se integra a um grupo de franceses que se tornam seus companheiros de coração e de armas. Passando por formações e treinamentos intensos nos quatro cantos da Inglaterra, os selecionados voltarão para a França ocupada para contribuir na resistência. Mas a espionagem alemã está alerta… A existência da SOE por muito tempo foi mantida em segredo. Várias décadas após o fim das atrocidades da Segunda Guerra, Os últimos dias de nossos pais é um dos primeiros romances a abordar sua criação e a relembrar as verdadeiras relações entre a Resistência e a Inglaterra de Churchill. Dicker constrói um livro sobre amor, amizade e medo, com uma profunda reflexão sobre o ser humano e suas fraquezas.


Uma-Prova-do-CeuUma prova do céu

Dr. Eben Alexander

A jornada de um neurocirurgião à vida após a morte

Sextante, 2013

“Minha experiência mostrou que a morte não é o fim da consciência e que a existência humana continua no além-túmulo. E, mais importante ainda, ela se perpetua sob o olhar de um Deus que nos ama e que se importa com cada um de nós.

Cético, defensor da lógica científica e neurocirurgião há mais de 25 anos, o Dr. Eben Alexander viu sua vida virar do avesso quando passou por uma experiência que ele mesmo considerava impossível. Vítima de uma meningite bacteriana grave, ficou em coma por sete dias. Enquanto os médicos tentavam controlar a doença, algo extraordinário aconteceu.

Eben embarcou numa jornada por um mundo completamente estranho. Sem consciência da própria identidade, foi mergulhando cada vez mais fundo nessa realidade difusa, onde conheceu seres celestiais e fez descobertas transformadoras sobre a existência da vida após a morte e a profunda relação que todos nós temos com Deus.

Quando os médicos já pensavam em suspender seu tratamento, o inesperado aconteceu: seus olhos se abriram. Ele estava de volta. Mas nunca mais seria o mesmo. Aquela experiência o levou a questionar tudo em que acreditava até então. Afinal, como neurocirurgião, ele sabia que o que vivenciou não poderia ter sido uma mera fantasia produzida por seu cérebro, que estava praticamente destruído.

Analisando as evidências à luz dos conhecimentos científicos, o Dr. Eben decidiu compartilhar essa incrível história para mostrar que ciência e espiritualidade podem e devem andar juntas.

Narrado com o fascínio de um paciente que visitou o outro lado e com a objetividade de um médico que tenta comprovar a veracidade de sua experiência, este é um livro emocionante sobre a cura física e espiritual e a vida que se esconde nas diversas dimensões do Universo.”


Hereges

Leonardo Padura
Boitempo, 2015

O ponto de partida é um episódio real: a chegada ao porto de Havana do navio S.S. Saint Louis, em 1939, onde se escondiam 900 refugiados vindos da Alemanha. A embarcação passou vários dias à espera de uma autorização para o desembarque. No romance, o garoto Daniel Kaminsky e seu tio, aguardavam nas docas, trazendo um pequeno quadro de Rembrandt que pertencia à família desde o século XVII e que esperavam utilizar como moeda de troca para garantir o desembarque da família que estava no navio. No entanto, o plano fracassa, a autorização não é concedida, e o navio retorna à Alemanha, levando também a esperança do reencontro. Quase setenta anos depois, em 2007, o filho de Daniel, Elías, viaja dos Estados Unidos a Havana para esclarecer o que aconteceu com o quadro e sua família.


o homemO Homem que Amava os Cachorros

Leonardo Padura
Boitempo, 2013

A história é narrada, no ano de 2004, pelo personagem Iván, um aspirante a escritor que atua como veterinário em Havana e, a partir de um encontro enigmático com um homem que passeava com seus cães, retoma os últimos anos da vida do revolucionário russo Leon Trotski, seu assassinato e a história de seu algoz, o catalão Ramón Mercader, voluntário das Brigadas Internacionais da Guerra Civil Espanhola e encarregado de executá-lo.

Esse ser obscuro, que Iván passa a denominar “o homem que amava os cachorros”, confia a ele histórias sobre Mercader, um amigo bastante próximo, de quem conhece detalhes íntimos. Diante das descobertas, o narrador reconstrói a trajetória de Liev Davidovitch Bronstein, mais conhecido como Trotski, teórico russo e comandante do Exército Vermelho durante a Revolução de Outubro, exilado por Joseph Stalin após este assumir o controle do Partido Comunista e da URSS, e a de Ramón Mercader, o homem que empunhou a picareta que o matou, um personagem sem voz na história e que recebeu, como militante comunista, uma única tarefa: eliminar Trotski. São descritas sua adesão ao Partido Comunista espanhol, o treinamento em Moscou, a mudança de identidade e os artifícios para ser aceito na intimidade do líder soviético, numa série de revelações que preenchem uma história pouco conhecida e coberta, ao longo dos anos, por inúmeras mistificações.

As duas trajetórias ganham sentido pleno quando Iván projeta sobre elas sua própria experiência na Cuba moderna, seu desenvolvimento intelectual e seu relacionamento com “o homem que amava os cachorros”.


pintassilgoO pintassilgo

Donna Tartt
Companhia das Letras, 2014

Theo Decker, um nova-iorquino de treze anos, sobrevive milagrosamente a um acidente que mata sua mãe. Abandonado pelo pai, Theo é levado pela família de um amigo rico. Desnorteado em seu novo e estranho apartamento na Park Avenue, perseguido por colegas de escola com quem não consegue se comunicar e, acima de tudo, atormentado pela ausência da mãe, Theo se apega a uma importante lembrança dela: uma pequena, misteriosa e cativante pintura que acabará por arrastá-lo ao submundo da arte.

Já adulto, Theo circula com desenvoltura entre os salões nobres e o empoeirado labirinto da loja de antiguidades onde trabalha. Apaixonado e em transe, ele será lançado ao centro de uma perigosa conspiração.
O Pintassilgo é uma hipnotizante história de perda, obsessão e sobrevivência, um triunfo da prosa contemporânea que explora com rara sensibilidade as cruéis maquinações do destino.


homeroA odisseia de Homero

Gwen Cooper
Editora Sextante, 2010

Todo mundo que tem gatos sabe que eles são dotados de uma sensibilidade incrível e possuem uma forma peculiar de encarar a vida. Mas Homero tinha muito mais a ensinar.

Abandonado, cego e rejeitado, ele tinha tudo para ser amuado e medroso. Ninguém imaginaria que um gato sem os olhos – que precisaram ser retirados cirurgicamente para garantir sua sobrevivência – seria capaz de levar uma vida normal, com a alegria e a esperteza características dos felinos.

Contrariando todas as expectativas, Homero vivia como se seus olhos não lhe fizessem falta. Era bagunceiro, implicante, temperamental, divertido e dengoso como qualquer outro gato. Gwen Cooper fazia questão de afirmar que ele não era diferente. Mas ele era.

Diferente não por causa da falta de visão, mas por sua capacidade de fazer aflorar nas pessoas o que elas tinham de melhor. Parecia haver em seu espírito uma sabedoria oculta e uma energia latente que inspiravam todos à sua volta.

Homero se tornou o centro do mundo de sua dona. Foi se esforçando para garantir a segurança do seu gato que ela aprendeu a estabelecer a sua própria. Foi preocupando-se com a felicidade dele que Gwen percebeu quanto estava sozinha. E foi lhe oferecendo um amor incondicional que ela permitiu que esse sentimento entrasse em sua vida.

Mais do que um livro divertido e comovente sobre as aventuras de um gatinho, A odisseia de Homero é uma história de superação, de autoconhecimento, de transformação e de crescimento pessoal. Ela vai fazer você rir, se emocionar e compreender que, para conseguir o que queremos da vida, muitas vezes precisamos dar um salto no escuro, da mesma forma que Homero: confiando em nossos instintos e acreditando que sempre cairemos de pé.


O Jardim Secreto de Eliza

Kate Morton
Editora Rocco, 2009

O Jardim Secreto de Eliza – Em 1913, um navio chega à Austrália direto de Londres, trazendo com ele uma menina de quatro anos, absolutamente sozinha, sem um acompanhante adulto sequer. Com ela, apenas uma pequena mala com um livro de contos de fadas. O mistério de quem era a bela garota, que dizia não lembrar seu nome, e de como chegou ao porto, jamais foi desvendado. Em suas memórias ela trazia apenas a imagem de uma mulher que ela chamava de a dama ou a Autora e que dizia que viria buscá-la. Muitos anos depois, em 2005, na cidade australiana de Brisbane, a doce e reservada Cassandra herda de sua avó Nell uma casa na Inglaterra. Surpresa, ela descobre que a casa esconde as origens de sua avó, que foi uma vez a bela menina sem nome perdida no porto.

Enquanto acompanha a viagem de Cassandra para a Inglaterra em busca de suas origens, a autora revela uma trama paralela que se desenrola muitos anos antes do nascimento da menina, quando Nell vê seu mundo cair depois que seu pai revela, às vésperas de seu noivado, que ela não é sua filha verdadeira. A notícia a transforma numa mulher estranha, colecionadora de artigos antigos e raros e que vive numa casa em uma região afastada da Austrália. Seu exílio auto imposto, no entanto, é quebrado quando sua filha deixa a pequena Cassandra a seus cuidados. Revoltada com a filha por ter abandonado a menina, assim como aconteceu com ela quando criança, Nell acaba estreitando laços com a neta.

Um dia, porém, nos idos dos anos 1970, Nell, resolve finalmente reconstituir o caminho de volta a terra de onde veio: Londres. Lá, descobre muitas coisas sobre seu passado, incluindo as lembranças da moça que chamava de A Autora: Eliza Makepeace, uma travessa menina contadora de histórias que tinha sua própria cota de tragédias para viver na Inglaterra da virada do século XIX para o XX. Seria Eliza mãe de Nell? E por que ela a abandonou? Agora, é a vez de Cassandra revirar a pequena mala de segredos da avó e saber o que Nell conseguiu descobrir, se é que ela obteve sucesso em sua busca


Na terra da nuvem branca

Sarah Lark
Europa Editora , 2013

Governanta e professora de uma rica família em Londres, Helen Davenport anseia por um casamento, mas, sem pretendentes e já perto de completar 30 anos, sabe que suas possibilidades não são boas. Quando vê, na sua igreja, um anúncio de um fazendeiro na Nova Zelândia que procura uma mulher solteira e honrada para se casar, não pensa duas vezes. Após uma breve troca de correspondências com o pretendente, decide aceitar a proposta e emigrar.
Não muito longe, no País de Gales, Gwyneira Silkham, filha de um nobre e rico criador de ovelhas, está entediada com sua vida. Durante uma negociação de matrizes com um rico fazendeiro da Nova Zelândia, seu pai aceita o desafio para um jogo de cartas aparentemente inofensivo. Acaba apostando — e perdendo — a mão de sua filha em favor do filho do fazendeiro. Surpreendentemente, em vez de se revoltar, Gwyn vê na distante colônia a chance de uma vida vibrante e plena de aventuras.
Ambientado no século 19, durante o início da colonização inglesa na Nova Zelândia, o romance Na Terra da Nuvem Branca conta a história dessas duas corajosas mulheres que mudam radicalmente suas vidas e partem rumo ao desconhecido. Elas se encontram no navio, durante a longa e perigosa viagem, e começam a construir laços de uma duradoura amizade, que será decisiva na luta para a conquista de seus ideais.
Mesmo sendo uma história ficcional, a autora Sara Lark lança um olhar feminino sobre o momento histórico da colonização e a cultura dos nativos maoris. Destaca ainda a personalidade das mulheres e as dificuldades que enfrentam face às oportunidades que uma terra em formação oferece. E constrói uma saga envolvente e apaixonante.


A cidade do sol

Khaled Hosseini
Editora Nova Fronteira, 2013

Mariam tem 33 anos. Sua mãe morreu quando ela tinha 15 anos e Jalil, o homem que deveria ser seu pai, a deu em casamento a Rashid, um sapateiro de 45 anos. Ela sempre soube que seu destino era servir seu marido e dar-lhe muitos filhos. Mas as pessoas não controlam seus destinos.
Laila tem 14 anos. É filha de um professor que sempre lhe diz: “Você pode ser tudo o que quiser.” Ela vai à escola todos os dias, é considerada uma das melhores alunas do colégio e sempre soube que seu destino era muito maior do que casar e ter filhos. Mas as pessoas não controlam seus destinos. Confrontadas pela história, o que parecia impossível acontece: Mariam e Laila se encontram, absolutamente sós. E a partir desse momento, embora a história continue a decidir os destinos, uma outra história começa a ser contada, aquela que ensina que todos nós fazemos parte do “todo humano”, somos iguais na diferença, com nossos pensamentos, sentimentos e mistérios.


Holocausto brasileiro
Vida, Genocídio e 60 Mil Mortes no Maior Hospício do Brasil

Daniela Arbex
Geração, 2014

Neste livro-reportagem fundamental, a premiada jornalista Daniela Arbex resgata do esquecimento um dos capítulos mais macabros da nossa história: a barbárie e a desumanidade praticadas, durante a maior parte do século XX, no maior hospício do Brasil, conhecido por Colônia, situado na cidade mineira de Barbacena. Ao fazê-lo, a autora traz à luz um genocídio cometido, sistematicamente, pelo Estado brasileiro, com a conivência de médicos, funcionários e também da população, pois nenhuma violação dos direitos humanos mais básicos se sustenta por tanto tempo sem a omissão da sociedade.
Pelo menos 60 mil pessoas morreram entre os muros da Colônia. Em sua maioria, haviam sido internadas à força. Cerca de 70% não tinham diagnóstico de doença mental. Eram epiléticos, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, gente que se rebelava ou que se tornara incômoda para alguém com mais poder. Eram meninas grávidas violentadas por seus patrões, esposas confinadas para que o marido pudesse morar com a amante, filhas de fazendeiros que perderam a virgindade antes do casamento, homens e mulheres que haviam extraviado seus documentos. Alguns eram apenas tímidos. Pelo menos 33 eram crianças.


A resposta

Kathryn Stockett
Bertrand Brasil, 2011

A Resposta – Uma história de otimismo ambientada no Mississippi em 1962, durante a gestação do movimento dos direitos civis nos EUA.

Eugenia Skeeter Phelan acabou de se graduar na faculdade e está ansiosa para tornar-se escritora, mas encontra a resistência da mãe, que quer vê-la casada. Porém, o único emprego que consegue é como colunista de dicas domésticas do jornal local. É assim que ela se aproxima de Aibellen, a empregada de uma de suas amigas. Em contanto com ela, Skeeter começa a se lembrar da negra que a criou e, aconselhada a escrever sobre o que a incomoda, tem uma ideia perigosa: escrever um livro em que empregadas domésticas negras relatam o seu relacionamento com patroas brancas.

Mesmo com receio de prováveis retaliações, ela consegue a ajuda de Aibileen, empregada que já ajudou a criar 17 crianças brancas, mas chora a perda do próprio filho, e Minny, cozinheira de mão cheia que, por não levar desaforo para casa, já esteve por diversas vezes desempregada após bater boca com suas patroas. Uma história emocionante e estarrecedora onde a cor da pele das pessoas determina toda a sua vida. Um livro que, devido ao seu tema, chegou a ser recusado por quase sessenta editoras antes de ser publicado.

Sugestões de leitura para adultos – edições portuguesas

o olhar de sophie jojo moyesO olhar de Sophie

Jojo Moyes
Porto Editora, 2014

Somme, 1916. Sophie vive numa vila ocupada pelo exército alemão, tentando sobreviver às privações e brutalidade impostas pelo invasor, enquanto aguarda notícias do marido, Edouard Lefèvre, um pintor impressionista, que se encontra a lutar na Frente. Quando o comandante alemão vê o retrato de Sophie pintado por Edouard, nasce uma perigosa obsessão que leva Sophie a arriscar tudo – a família, a reputação e a vida.
Quase um século depois, o retrato de Sophie encontra-se pendurado numa parede da casa de Liv Halston, em Londres. Entretanto, Liv conhece o homem que a faz recuperar a vontade de viver, após anos de profundo luto pela morte prematura do marido. Mas não tardará que Liv sofra uma nova desilusão – o quadro que possui é agora reclamado pelos herdeiros, e Paul, o homem por quem se apaixonou, está encarregado de investigar o seu paradeiro…
Até onde estará Liv disposta a ir para salvar este quadro? Será o retrato de Sophie assim tão importante que justifique perder tudo de novo?


comércioUm comércio respeitável

Philippa Gregory
Porto Editora, 2013

1787. Bristol é uma cidade em franco crescimento, uma cidade onde o poder atrai os que estão dispostos a correr riscos. Josiah Cole, um homem de negócios que se dedica ao comércio de escravos, decide arriscar tudo para fazer parte da comunidade que detém o poder na cidade. No entanto, para isso, Cole vai precisar de capital e de uma esposa bem relacionada que lhe abra as portas necessárias. Casar com Frances Scott é uma solução conveniente para ambas as partes. Ao trocar as suas relações sociais pela proteção de Cole, Frances descobre que a sua vida e riqueza dependem do comércio respeitável do açúcar, rum e escravos…
Em Um Comércio Respeitável, Philippa Gregory oferece-nos um retrato vívido e impressionante de uma época complexa onde imperam a ganância e a crueldade que devastaram todo um continente.


1A bibliotecária de Auschwitz

Antonio G. Iturbe
Agir, 2014

Minuciosamente documentado, e tendo como base o testemunho de Dita Dorachova, a jovem bibliotecária checa do Bloco 31, este livro conta a história inacreditável, mas verídica, de uma jovem de 14 anos que arriscou a vida para manter viva a magia dos livro, ao esconder dos nazis durante anos a sua pequena biblioteca, de apenas oito volumes, no campo de extermínio de Auschwitz.
Sobre a lama negra de Auschwitz, que tudo engole, Fredy Hirsch ergueu uma escola. Num lugar onde os livros são proibidos, a jovem Dita esconde debaixo do vestido os frágeis volumes da biblioteca pública mais pequena, recôndita e clandestina que jamais existiu.
No meio do horror, Dita dá-nos uma maravilhosa lição de coragem: não se rende e nunca perde a vontade de viver nem de ler, porque, mesmo naquele terrível campo de extermínio nazi, «abrir um livro é como entrar para um comboio que nos leva de férias».
Um romance comovente: uma história maravilhosa, pungente e diferente de tudo o que já leu sobre o Holocausto e de que poucos têm conhecimento.


OsUltimosDiasDosNossosPaisOs últimos dias dos nossos pais

Joël Dicker
Agir, 2014

Em 1940, Winston Churchill desenha um plano que mudará o curso da guerra: criar uma nova unidade nos serviços secretos — Special Operations Executive (SOE) — que leve a cabo ações de sabotagem a partir do interior das linhas inimigas, uma estratégia jamais vista.
Meses mais tarde, o jovem Paul-Émile parte de Paris rumo a Londres com a esperança de se juntar à Resistência. O SOE não tarda a recrutá-lo, bem como a um grupo de jovens voluntários. Depois de um treino brutal, os poucos eleitos para integrar a nova unidade são enviados para a França ocupada com a missão de treinar forças de resistência. Aí conhecerão o amor, o medo, a coragem e a amizade.
Mas, no Continente, a contra espionagem alemã ameaça toda a operação e o destino dos jovens militares…
Os últimos dias dos nossos pais é um livro profundamente humano e uma verdadeira homenagem à coragem e à lealdade.


Uma-Prova-do-CeuUma prova do céu

Dr. Eben Alexander
O testemunho de um neurocirurgião sobre a vida para além da morte
Lua de Papel, 2013

Em novembro de 2008, um reputado neurocirurgião americano contraiu uma espécie rara de meningite. Levado de urgência para o hospital, entrou em coma. Durante sete dias esteve em morte cerebral. Quando a equipa clínica discutia já a hipótese de desligar a máquina, deu-se o primeiro milagre: o médico despertou.
O segundo milagre, só viríamos a conhecê-lo em Uma Prova do Céu. Nos sete dias em que esteve cerebralmente morto, o neurocirurgião viajou até um território inexplorado – a vida depois da morte. O cético cientista, que durante anos negara a existência de Deus, viu-se confrontado com uma experiência transcendente que lhe deixou marcas profundas. Ao sétimo dia, quando emergiu do coma, soube que a sua vida nunca mais seria a mesma.
Autor de mais de 200 artigos científicos, percebeu que a ciência e o divino podem viver lado a lado. E que, como neurocirurgião, iria continuar a investigar os segredos do cérebro, mas agora munido da certeza de que a vida continua depois da morte.


HeregesHereges

Leonardo Padura
Porto Editora, 2015

Em 1939, o S.S. Saint Louis, onde viajavam novecentos judeus fugidos da Alemanha, passou vários dias ancorado no porto de Havana à espera de autorização para desembarcar. Um rapaz, Daniel Kaminsky, e o tio aguardam no cais a saída dos familiares, confiantes de que estes tentariam os oficiais havaneses com o tesouro que traziam escondido: uma pequena tela de Rembrandt, na posse dos Kaminsky desde o século XVII. Mas o plano fracassou e o transatlântico regressou à Europa, levando consigo qualquer esperança de reencontro e condenando muitos dos seus passageiros.
Volvidos largos anos, em 2007, quando essa tela vai a leilão em Londres, o filho de Daniel, Elías, viaja dos Estados Unidos a Havana para descobrir o que aconteceu com o quadro e com a sua família. Só um homem como o investigador Mario Conde o poderá ajudar. Elías descobre então que o pai vivia atormentado por um crime, e que esse quadro, uma imagem de Cristo, teve como modelo outro judeu, que quis trabalhar no atelier de Rembrandt e aprender a pintar com o mestre.
Hereges é um romance absorvente sobre uma saga judaica que chega até aos nossos dias e que vem confirmar o autor como um dos narradores mais ambiciosos e internacionais da língua espanhola.


O Homem que gostava de cãesO homem que gostava de cães

Leonardo Padura
Porto Editora, 2015

Em 2004, com a morte da mulher, Iván, um aspirante a escritor, relembra um episódio que lhe aconteceu em 1977, quando conheceu um homem enigmático que passeava pela praia acompanhado de dois galgos russos. Após vários encontros, «o homem que gostava de cães» começou a confidenciar-lhe relatos singulares sobre o assassino de Trótski, Ramón Mercader, de quem conhecia pormenores muito íntimos. Graças a essas confidências, Iván irá reconstituir a trajetória de Liev Davídovitch Bronstein, mais conhecido por Trótski, e de Ramón Mercader, e de como se tornaram vítima e verdugo de um dos crimes mais reveladores do século XX.
Através de uma escrita poderosa sobre duas testemunhas ambíguas e convincentes, Leonardo Padura traça um retrato histórico das consequências da mentira ideológica e do seu poder destrutivo sobre a utopia mais importante do século XX.


pintassilgoO pintassilgo

Donna Tartt
Editorial Presença, 2015

Theo Decker, um adolescente de 13 anos, vive em Nova Iorque com a mãe, com quem partilha uma relação muito próxima e que é a figura parental única, após a separação dos pais pouco antes do trágico acontecimento que dá início a este romance. Theo sobrevive inexplicavelmente ao acidente em que a mãe morre, no dia em que visitavam o Metropolitan Museum. Abandonado pelo pai, Theo é levado para casa da família de um amigo rico. Mas Theo tem dificuldade em se adaptar à sua nova vida em Park Avenue, e sente uma dor profunda pela falta da mãe. É neste contexto que uma pequena e misteriosa pintura que ela lhe tinha mostrado no dia em que morreu se vai impondo a Theo como uma obsessão. E será essa pintura que finalmente, já adulto, o conduzirá a entrar no submundo do crime.
O Pintassilgo é um livro poderoso sobre amor e perda, sobrevivência e capacidade de nos reinventarmos, uma brilhante odisseia através da América dos nossos dias, onde o suspense e a arte são dois elementos decisivos para prender o leitor.


odisseiahomerA odisseia de Homer

Gwen Cooper
Pergaminho, 2011

A última coisa que Gwen Cooper queria era adotar outro gato. Já tinha duas gatas, para não falar de um emprego em que lhe pagavam uma miséria, e estava a tentar recuperar de uma separação difícil. Até que a veterinária das suas gatas ligou para lhe falar de um gatinho de três semanas, abandonado e maltratado, cujos olhos tiveram de ser retirados cirurgicamente. Gwen era a sua última esperança de encontrar um lar. Foi amor à primeira vista. O gatinho era uma bola de pêlo mínima, preta e assustada e, mesmo tendo consciência das dificuldades que ele enfrentaria por causa da sua cegueira, Gwen decidiu adotá-lo — e ele tornou-se os olhos pelos quais ela passaria a ver o mundo.
Batizado de «Homer» — uma homenagem ao poeta grego supostamente cego, criador da Odisseia e do seu herói, Ulisses — este gatinho cresceu até se tornar um animal forte, confiante, cheio de entusiasmo e com uma vontade inesgotável de brincar! Mas foi a lealdade inabalável de Homer, com sua capacidade ilimitada de amar e o seu exemplo de força, superação e coragem, que levou Gwen a mudar a sua vida. E, quando conheceu o homem com quem viria a casar, Gwen percebeu que Homer lhe tinha ensinado a lição mais importante da vida: que o amor não é algo que possa ser visto com o olhar.


O jardim dos segredos

Kate Morton
Porto Editora, 2014

Uma criança perdida: em 1913 uma criança é encontrada só, num barco que se dirigia à Austrália. Uma mulher misteriosa prometera tomar conta dela, mas desapareceu sem deixar rasto.
Um terrível segredo: no seu 21.º aniversário, Nell Andrews descobre algo que mudará a sua vida para sempre. Décadas depois, embarca em busca da verdade, numa demanda que a conduz até à costa da Cornualha e à bela e misteriosa Mansão Blackhurst.
Uma herança misteriosa: aquando do falecimento de Nell, a neta, Cassandra, depara-se com uma herança surpreendente. A Casa da Falésia e o seu jardim abandonado são famosos nas redondezas pelos segredos que ocultam — segredos sobre a família Mountrachet e a sua governanta, Eliza Makepeace, uma escritora de obscuros contos de fadas. É aqui que Cassandra irá por fim desvelar a verdade sobre a família e resolver o mistério de uma pequena criança perdida.
Um livro marcante, que aborda com mestria a complexidade dos sentimentos humanos.


No país da nuvem branca

Sarah Lark
Marcador, 2014

Londres, 1852. Duas raparigas empreendem uma viagem de barco rumo à Nova Zelândia e tornam-se amigas. Trata-se, para ambas, do início de uma nova vida como futuras esposas de dois homens que conhecem apenas por correspondência. É o começo de uma nova vida com homens que não conhecem. Gwyneira, de origem nobre, está prometida ao filho de um magnata da criação de ovelhas, enquanto Helen, uma jovem precetora, parte para se casar com um fazendeiro. Procuram encontrar a felicidade num país que promete ser o paraíso. No entanto, as ilusões de ambas depressa se esfumam, principalmente quando descobrem que a sua amizade está em perigo porque os maridos são inimigos.
Gwyneira e Helen são mais fortes do que acreditavam ser e rompem com os preconceitos e as restrições da sociedade onde vivem, mas serão capazes de alcançar o amor e a felicidade do outro lado do mundo?
Um romance cativante sobre o amor e o ódio, a confiança e a inimizade, e sobre duas famílias cujo destino está indissoluvelmente unido.


um presenteUm presente muito especial

Joanne Huist Smith
Nascente, 2014

Depois da morte inesperada do marido, Joanne sente-se incapaz de retomar a sua vida e de ser o exemplo de força que os seus filhos, Ben, Nick e Megan, precisam mais do que nunca. Com a aproximação da quadra natalícia, tudo parece ainda mais duro de suportar.
Mas, 12 dias antes do Natal, um presente é deixado misteriosamente à porta de casa, acompanhado de um cartão com a assinatura «Os vossos verdadeiros amigos». No dia a seguir, um novo presente, no dia seguinte mais um presente, e assim acontece, até à véspera de Natal.
Estes 12 presentes irão tornar-se uma dádiva de grandeza incomparável e acabam por dar origem a um milagre: a reaproximação entre mãe e filhos e o fortalecimento dos seus laços de amor.
Uma história que aquece o coração e que mostra como simples atos de bondade são capazes de transformar um momento doloroso num caminho de força e amor.


Enquanto houver estrelas no céu

Kristin Harmel
Porto Editora, 2014

Desde sempre, Rose, ao entardecer, olhava o céu em busca da estrela da tarde. Era aquela estrela, agora que a sua memória estava a abandoná-la, que lhe permitia recordar-se de quem era e de onde vinha; que a transportava para os seus dezassete anos, para uma confeitaria nas margens do Sena. Ninguém conhecia a sua história nem sequer a sua neta, Hope. Num dos seus raros momentos de lucidez sente que é importante falar-lhe de um passado longínquo, que manteve em segredo durante setenta anos e que em breve ficará perdido para sempre. Munida de uma lista de nomes e de fragmentos de uma vida, Hope parte para Paris em busca de respostas.
Para Hope esta será também uma viagem de descoberta: de tradições religiosas há muito diluídas, de histórias vividas numa Paris ocupada onde o amor sobrevive e, sobretudo, da sua capacidade de recomeçar e acreditar em si mesma.

Kristin Harmel escreve com tamanha perspicácia e emoção que as personagens que criou permanecem com o leitor muito depois de este terminar o livro.


Mil sóis resplandecentes

Khaled Hosseini
Presença, 2008

Mil Sóis Resplandecentes é um romance pleno de sensibilidade, que tem como pano de fundo as convulsões sociopolíticas que abalaram o Afeganistão nas últimas três décadas.

Mariam e Laila são duas mulheres que a guerra e a morte obrigam a partilhar um marido comum e cuja coragem lhes permitirá lutar pela sua felicidade num cenário impiedoso.

Uma obra inesquecível que evoca o que há de mais intrínseco em todos os seres humanos: o direito ao amor, a um lar e à integridade, e que reflete sobre as relações humanas face à impunidade e às atitudes de tirania.


Não odiarei

Izzeldin Abuelaish
Planeta, 2012

O doutor Izzeldin Abuelaish — agora conhecido com o “Médico de Gaza” — tornou-se conhecido em todo o mundo na sequência de uma terrível tragédia: a 16 de Janeiro de 2009, bombardeiros israelitas atingiram a sua casa na Faixa de Gaza, matando três das filhas e a sobrinha.
Médico palestiniano formado em Harvard, nascido e criado num campo de refugiados na Faixa de Gaza, Abuelaish tem, ao longo de quase toda a sua vida, cruzado as linhas que dividem israelitas e palestinianos, na qualidade de médico que assiste as vítimas de ambos os lados do conflito; como humanista, tem também pugnado pelos direitos das mulheres a melhor saúde e educação, e pelo desenvolvimento no Médio Oriente.
Como pai de três filhas mortas por soldados israelitas, a sua reação a esta tragédia fez notícia e valeu-lhe prémios humanitários em todo o mundo. Em vez de procurar vingança ou de se abandonar ao ódio, tem apelado ao entendimento entre os povos da região, sendo a sua esperança mais profunda a de que as filhas venham a ser “o último sacrifício no caminho para a paz entre palestinianos e israelitas.”


Holocausto Brasileiro
Vida, Genocídio e 60 Mil Mortes no Maior Hospício do Brasil

Daniela Arbex
Guerra e Paz editores, 2014

Em Holocausto Brasileiro, a premiada jornalista de investigação Daniela Arbex resgata do esquecimento esta chocante e macabra história do século XX brasileiro: um genocídio feito pelas mãos do Estado, com a conivência de médicos, funcionários e população, que roubou a dignidade e a vida a 60.000 pessoas.
Bebiam água do esgoto. Comiam ratos. Morriam ao frio e à fome. Eram exterminados com electrochoques tão fortes, que toda a cidade ficava sem luz, por sobrecarga da rede. Os bebés eram roubados às mães logo à nascença. Nos períodos de maior lotação, morriam 16 pessoas por dia dentro dos muros do Colônia. Ao morrer, davam lucro. Os cadáveres eram vendidos às faculdades de medicina. Quando o número de corpos excedia a procura, eram decompostos em ácido, no pátio, diante dos pacientes. Os ossos eram comercializados. Nada ali se perdia. Excepto a vida.
É a essas 60.000 pessoas que Daniela Arbex devolve agora o rosto e a identidade, num relato que recupera o testemunho dos poucos sobreviventes e dá voz aos milhares que já não podem contar a sua própria história. O hospício de Colônia só foi transformado em verdadeiro Centro Hospitalar Psiquiátrico em 1980.


ettyEtty Hillesum: Uma vida transformada

Patrick Woodhouse
Paulinas, 2011

A 9 de março de 1941, uma judia holandesa de 27 anos de idade, chamada Etty Hillesum — que vivia na cidade de Amesterdão, ocupada pelo inimigo — escreveu a sua primeira entrada num diário, que se tornou um dos mais notáveis documentos surgidos do Holocausto nazi. Ao longo dos seguintes dois anos e meio, uma jovem mulher insegura, caótica e perturbada foi transformada numa pessoa que inspirava todos aqueles com quem partilhava o sofrimento do campo de trânsito de Westerbork e com quem viria a perecer em Auschwitz.
Através dos seus diários e cartas, ela continua a ser alguém de profundamente inspirador: uma jovem extraordinariamente viva e expressiva, que viveu uma espiritualidade de esperança no período mais sombrio do século XX.
Etty Hillesum: uma vida transformada explora a vida e os escritos de Etty, revelando-a como uma figura assombrosamente contemporânea.


as serviçaisAs serviçais

Kathryn Stockett
Saída de Emergência, 2013

Skeeter tem vinte e dois anos e acaba de regressar da universidade. Pode ter uma licenciatura, mas estamos em 1962, no Mississípi, e a sua mãe só a irá deixar em paz quando a vir com uma aliança no dedo. Provavelmente a jovem encontraria conforto junto da sua adorada Constantine, a empregada negra que a criou, mas esta foi embora e ninguém lhe diz para onde.
Aibileen é uma empregada negra que criou dezassete crianças brancas. Mas desde que o seu próprio filho morreu, algo mudou dentro de si. Quem a conhece sabe que tem um grande coração e uma história ainda maior para contar. Minny, a melhor amiga de Aibileen, é a mulher com a língua mais afiada do Mississípi. Cozinha divinamente, mas tem sérias dificuldades em manter o emprego… até ao momento em que encontra uma nova e insólita patroa.
Estas três personagens extraordinárias vão cruzar-se e iniciar um projeto clandestino que as vai colocar a todas em perigo. E porquê? Porque estão a sufocar com as barreiras que definem a sua cidade, o seu tempo e as suas vidas.

Meninos de todas as cores – Luísa Ducla Soares

Conceição Dinis; Fátima Lima (org.)

Aventura das Letras

Porto, Porto Editora, 2003

 

Era uma vez um menino branco chamado Miguel, que vivia numa terra de meninos brancos e dizia:

É bom ser branco

porque é branco o açúcar, tão doce,

porque é branco o leite, tão saboroso,

porque é branca a neve, tão linda.

Mas certo dia o menino partiu numa grande viagem e chegou a uma terra onde todos os meninos eram amarelos. Arranjou uma amiga chamada Flor de Lótus, que, como todos os meninos amarelos, dizia:

É bom ser amarelo

porque é amarelo o Sol

e amarelo o girassol

mais a areia da praia.

O menino branco meteu-se num barco para continuar a sua viagem e parou numa terra onde todos os meninos são pretos. Fez-se amigo de um pequeno caçador chamado Lumumba que, como os outros meninos pretos, dizia:

É bom ser preto

como a noite

preto como as azeitonas

preto como as estradas que nos levam para

toda a parte.

O menino branco entrou depois num avião, que só parou numa terra onde todos os meninos são vermelhos.

Escolheu para brincar aos índios um menino chamado Pena de Águia. E o menino vermelho dizia:

É bom ser vermelho

da cor das fogueiras

da cor das cerejas

e da cor do sangue bem encarnado.

O menino branco foi correndo mundo até uma terra onde todos os meninos são castanhos. Aí fazia corridas de camelo com um menino chamado Ali-Babá, que dizia:

É bom ser castanho

como a terra do chão

os troncos das árvores

é tão bom ser castanho como um chocolate.

Quando o menino voltou à sua terra de meninos brancos, dizia:

É bom ser branco como o açúcar

amarelo como o Sol

preto como as estradas

vermelho como as fogueiras

castanho da cor do chocolate.

Enquanto, na escola, os meninos brancos pintavam em folhas brancas desenhos de meninos brancos, ele fazia grandes rodas com meninos sorridentes de todas as cores.

Luísa Ducla Soares

 

A menina da chuva

A menina da chuva

Eu estava de férias com o papá e a mamã numa ilha na Normandia, numa casa alugada, pequenina e pitoresca. Só que eu aborrecia-me. Sentia-me só. Por isso, todos os dias ia sentar-me num grande rochedo no meio da praia, a olhar para a dança de milhares de pequenas ondas no mar.

No céu, as nuvens carregadas de água corriam a toda a velocidade como se não quisessem fazer sombra à luz branca do sol. Ao longe, as gaivotas confundiam-se com as velas dos barcos. A praia estava quase deserta, de certeza por causa da água demasiado fria. Soprava um vento leve. Quando ele se metia no cabelo dos dois rapazinhos loiros que brincavam com um papagaio de papel, não muito longe de mim, fazia-os esvoaçar com muita graciosidade e leveza. Era bonito de se ver. Eu gostaria de ter cabelos assim tão lisos, em vez dos meus, encaracolados.  

Os dois rapazes eram gémeos, muito bonitos e de pele clara. Viviam com os pais numa casa alugada ao lado da nossa. Sempre que os encontrava na praia, o papá insistia comigo para ir brincar com eles. Eu não me atrevia. Nos olhos deles havia qualquer coisa que me desagradava, um brilho maldoso. Mas eu queria muito brincar com o papagaio de papel deles, segurá-lo entre os meus dedos, fechar os olhos e voar com ele até lá longe, bem no alto, onde as gaivotas faziam piruetas.

De repente, o papagaio fez um voo picado e caiu aos meus pés. Que sorte! Era a oportunidade, tão sonhada, de travar conhecimento com os meus dois vizinhos. Levantei-me, apanhei o objecto e entreguei-o aos rapazes que, entretanto, se tinham aproximado de mim. Sorri-lhes e disse-lhes que o papagaio era muito bonito. Fixavam-me, em silêncio, com um ar nada simpático. De repente, um deles tirou-me das mãos o papagaio de papel e pô-lo no chão, no sítio onde tinha caído.

— Não toques no nosso papagaio!

— Porquê? — perguntei, admirada.

— Porque não és francesa!

— Sou francesa, sou!

— Não — disse outro.

Baixei os olhos para olhar para mim. Vi-me branca, apenas um pouco bronzeada pelo sol de Verão. Fiquei triste e nervosa ao mesmo tempo. Não compreendia. Era a primeira vez que alguém me dizia uma maldade daquelas. Quis perguntar ao papá a razão daquilo, mas ele tinha adormecido. Então voltei a sentar-me no meu rochedo e pus-me a olhar para a dança do mar. Queria chorar. Não parava de olhar para a minha pele, tocava nos meus cabelos encaracolados. E se eu não fosse francesa?

Eis que, sem prevenir, a atmosfera ficou carregada. O céu enevoou-se. O papagaio de papel dos meninos maus soltou-se e desapareceu. Gritaram, surpreendidos. Senti que alguma coisa estava a acontecer. Um raio poderoso abriu caminho entre o céu e a terra, como um corredor transparente. Uma figura deslizou pelo seu interior, e saiu, vindo colocar-se à minha frente, cheia de poder. Olhou-me nos olhos e disse:

— Sou a filha da chuva.

Tinha a graciosidade de uma fada, e trazia um vestido de nuvens com reflexos azuis-acinzentados, leve como uma carícia. Os seus longos cabelos eram ondas de cor turquesa que lhe deslizavam até aos pés, o rosto parecia delicadamente esculpido pelo vento, nos olhos luziam-lhe duas contas de ouro nas quais vi o papagaio de papel. Das orelhas pendiam-lhe dois brincos, duas gotas de chuva que formavam uma fonte mágica.

Eu não era capaz de dizer palavra, de tão pasmada. Ela continuava a sorrir. Disse-me que tinha ouvido tudo lá de cima e por isso fizera desaparecer o papagaio. E entregou-mo, dizendo:

— Toma, vai tu mesma entregá-lo… — e em seguida disse: — Tu és bela, Faema — antes de desaparecer no corredor de luz.

Depois, tudo voltou ao normal. Nas minhas mãos tinha um papagaio de papel incrustado de minúsculas estrelas multicores. Levei-o aos dois rapazes maus. Nos seus olhos via-se agora o deslumbramento. Pensavam que eu era mágica e deixei-os que acreditassem nisso. Limitei-me a dizer:

— A menina da chuva, que veio do céu, trouxe-mo para vo-lo entregar.

E foi assim que me tornei francesa.

Azoug Begag

In : almanach

La Charte Corps Puce Jeunesse

A cor dos olhos

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A cor dos olhos

Naquele tempo, que não era como o tempo de hoje, os leões já tinham quatro patas mas, tal como os elefantes, não podiam meter-se por dois caminhos ao mesmo tempo!

Naquele tempo

naquela aldeia

havia Fati e Issa.

Fati dormia deitada numa esteira, sempre de barriga para baixo. Durante esse tempo, Issa sonhava deitado de costas, na cabana da mãe.

Uma manhã, Issa convidou Fati para ir com ele à pesca, no grande riacho.

― Fati, vens ou não pescar?

― Vou, mas… e se o peixe não morde?

― Ficamos à espera.

Partiram com ele à frente, como sempre.

Fati, que era cega, seguia-lhe os passos.

A mãe dela, como todas as mães da aldeia, sabia fazer um bom molho com sementes e também uma mistura saborosa de inhame. O pai conhecia os remédios contra as serpentes e os génios malfazejos, e contra os anões ruins do mato que só fazem mal!

Mas nem o pai nem a mãe sabiam transformar os olhos que não vêem em olhos que vêem!

Fati e Issa caminhavam num estreito carreiro vermelho.

Issa viu pássaros tecelões dar reviravoltas perto das folhas de um embondeiro.

Fati ouviu-os chilrear.

Tinha posto na cabeça um lenço para se proteger um pouco. Tal como Issa, sentia o sol a queimar-lhe os ombros como se fosse uma fogueira no mato.

Não sabia nada da forma zombeteira das sombras, sempre um pouco maiores, mas conseguia adivinhar a grande boca do sol que sugava o céu com gulodice.

Chegaram ao riacho.

― A água está bem desperta ― gritou Issa.

Fati mergulhou o dedo e exclamou:

― Esta água está toda molhada!

Issa preparou uma linha para Fati e outra para ele.

Deitaram-nas à água. Passou algum tempo.

Issa inclinou-se para Fati e murmurou-lhe, quase a morder-lhe a orelha:

― Não te mexas, vou andar alguns passos.

― Porquê?

― O sol está muito forte. Talvez encontre uma jujubeira que nos dê sombra.

Afastou-se, apressado, para fazer algo que ninguém poderia ter feito por ele!

Nada acontece sem se fazer anunciar…

Fati, com a linha entre os dedos, estava tão imóvel como uma velha termiteira, quando sentiu um abanão na mão. Quando sentiu o segundo abanão, foi como se estivesse à espera dele, precisamente naquele momento. Puxou com um gesto seco e, quando ouviu a água a salpicar, não teve dúvidas: era mesmo um peixe que tinha mordido o isco e que ela estava a pescar. Com cuidado, para não assustar nada nem ninguém, levantou-se, puxando sempre a linha com a mão.

Agarrou o pequeno peixe que dançava agarrado ao isco.

Disse em voz alta, para si própria: “É de certeza uma carpa, uma carpa pequena e linda.”

― Uma carpa que preferiria voltar para a água em vez de assar ao sol — respondeu-lhe uma voz.

― És tu, Issa?

― Não é o Issa, sou eu ― respondeu-lhe a carpa.

― Mas quem está a falar? ― perguntou Fati.

Não obteve resposta. Pensou que tinha sonhado.

Com cuidado, tirou o peixe do isco.

― Ufa, obrigado. Assim está melhor ― ouviu.

― Mas de quem é esta voz que não conheço?

― É minha. Sou a carpa que acabas de pescar, não vês?

― Não. Tenho olhos mas não vejo.

A carpa, que era menos medrosa do que uma tartaruga e mais faladora do que um quimbanda lisonjeador, continuou a falar.

― Será que me podes dizer o teu nome, tu que me pescaste?

― Fati.

― Fati, se voltares a pôr-me na água do riacho, posso dar-te o mais belo dos presentes.

― O que é o mais belo dos presentes?

― É o que quiseres… exactamente o que quiseres.

― Não existe o mais belo dos presentes.

― Existe, sim!

Fati pôs-se a rir e disse à carpa:

― Pequeno peixe, podes ofender o génio da água com as tuas mentiras.

― Não estou a mentir.

― Então faz-me ver o mundo com os meus dois olhos.

― O mundo inteiro?

― O mundo inteiro.

Sem pensar duas vezes, o pequeno peixe disse a Fati:

― Pega em duas das minhas escamas, e põe uma em cada olho.

― Depois…

― Depois, nada. É tudo. Verás o que quiseres ver.

Fati pegou em duas escamas e fez o que a carpa lhe tinha dito. Então, começou a ver de verdade, e os seus dois olhos tocaram o mundo.

― Agora, podes ver quase tudo ― disse-lhe a carpa.

― Porquê “quase”?

― Podes ver tudo, excepto os teus olhos. Com os próprios olhos, ninguém pode ver os seus próprios olhos.

Fati pôs o pequeno peixe no riacho e ele continuou a viver como um peixe na água.

Issa chegou. Tinha-se aliviado em algum lado.

Fati, que nunca o tinha visto, viu-o aproximar-se.

― Issa, estou a reconhecer-te.

― É lógico, porque me conheces.

― Reconheço-te com os meus olhos, não apenas com os ouvidos!

Issa tinha parado a dois passos de Fati. Olhava-a bem de perto, e assim podia ver-lhe os olhos. Exclamou:

― Mas o que é que se passa? Lavaste os olhos no céu?

― E por que dizes isso?

― Fati, os teus olhos estão azuis como o céu. Continuas negra mas tens os olhos cor do céu!

Fati contou-lhe tudo.

Quando chegaram à aldeia, Fati ficou espantada por ver um só mundo com os dois olhos.

No dia seguinte, de manhã, ouviram a aldeia a murmurar.

Issa, que continuava a dar-lhe a mão, escutou as vozes ao mesmo tempo que ela.

Viram chegar as três co-esposas do pai de Fati, e outras mulheres, e alguns homens. Tinham a boca cheia de maldades e gritavam. A seguir, chegaram os da aldeia. Eram piores do que animais loucos do mato. Gritavam:

― Bruxa!

― Fati, vai-te embora!

― Não passas de uma bastarda do céu!

― Bruxa azul! Deixa-nos, vai-te embora para sempre, tu e os teus olhos azuis!

― Excremento de abutre!

Puseram-se a atirar-lhe pedras e Fati não encontrou outra solução senão fugir. Issa, que tentara defendê-la, teve de fazer o mesmo.

Depois de uma longa corrida,  chegaram ao fundo,  ao fim do fim, um pouco mais longe do que o horizonte.

― Fati, eu gosto de ti.

― Não tens medo dos meus olhos?

― Fati, eu gosto de ti.

Tinham-se sentado frente a frente, à sombra de uma jujubeira.

Fati perguntou:

― Será que fechando os olhos, acabamos com a maldade?

― Não… não se acaba com nada. Se fechares os olhos, nem sequer acabas com as cóleras do mato.

Calaram-se. Issa tomou as mãos de Fati nas suas. Fati tinha dois olhos para ver e chorar. Murmurou-lhe:

― Eles têm medo. Estão cativos do medo que têm, e o medo faz esquecer o coração…

Nesse dia, nesse tempo, que se parecia muito com o tempo de hoje, Fati e Issa tinham o coração ferido como uma velha cabaça.

Levantaram-se e afastaram-se ainda mais da aldeia, talvez para encontrar a fonte dos quatro ventos do céu, aqueles que fazem as mesmas cócegas em todas as cores do mundo.

Muitas estações das chuvas deram lugar a muitas estações secas.

E ontem, na aldeia, um grande pássaro negro pousou na bela árvore vermelha florida. Era um calau.

Um calau negro de olhos azuis. Sim, negro de olhos azuis! Todos o acharam belo.

Este calau era um sinal. Logo que parou na grande árvore da aldeia, Fati e Issa chegaram.

Fati sorria tal como Issa. Foi ela quem disse:

― Bom dia, estávamos tão longe há tanto tempo… eis-nos aqui, os dois.

― Bom dia!

― Bom dia…

Foram muitos os que lhes ofereceram a água das boas-vindas.

No dia seguinte, Issa começou a construir a cabana deles.

Tal como acontecera com os pais deles, foi na sua aldeia que tiveram os filhos.

E foi assim.

Foi o quimbanda quem mo disse.

Yves Pinguilly, Florence Koenig

La couleur des yeux

Autrement Jeunesse, 2001

Tradução e adaptação

Texto cedido pelo blogue Verticalizar