1716 CARTAS

enNo dia 15 de novembro de 1942, disse o «Sim» ao meu noivo, orgulhosamente vestido com a sua farda do Exército dos E.U.A. Oito curtos meses depois, foi chamado para a frente de batalha na segunda guerra mundial, para local desconhecido no Pacífico e por tempo indeterminado.
Quando o meu jovem marido partiu, prometemos um ao outro escrevermo-nos todos os dias durante o tempo que estivéssemos separados. Decidimos numerar as cartas que enviássemos, de modo a sabermos se alguma se tinha perdido. Como nos escrevíamos diariamente, muitas vezes tínhamos pouco mais para dizer para além de «amo-te».
Mas em todas as cartas esta palavra estava sempre escrita.

A guerra levou o meu marido, médico-dentista do Exército, para a frente de batalha. Mas, quer ele estivesse no meio de uma batalha em Aleutians, Okinawa, ou nas Filipinas, arranjava sempre tempo, todos os dias, para me escrever. Em certas alturas, arranjou até tempo para mais do que escrever. Quando tinha momentos de descanso, fazia-me presentes ou adereços com os materiais que encontrava.
Durante um dos momentos de acalmia nas Filipinas, arranjou tempo para esculpir uma bonita faca em mogno para abrir cartas, com o meu nome, Louise, gravado de um lado e a inscrição «Filipinas 1944» do outro. Disse-me que era para me ajudar a abrir as cartas que me escrevia todos os dias.
Mais de cinquenta anos depois, a faquinha continua na minha secretária e é utlizada todos os dias para abrir o correio, embora nenhuma das cartas que recebo hoje em dia seja tão importante quanto as que recebia dele durante a guerra.

Havia dias e semanas em que eu não recebia correio. E, é claro, ficava preocupada com a segurança do meu marido —— muitos dos seus companheiros já tinham sido mortos. Inevitavelmente, contudo, havia um dia em que o correio me entregava uma quantidade de cartas de uma só vez. Punha-as então por ordem para as poder ler cronologicamente e saborear cada uma delas. Infelizmente, todas as cartas eram abertas e censuradas pelo Exército, e eu tinha de tentar imaginar o que estaria escrito por debaixo dos traços pretos.
Numa carta, quando o meu marido estava no Hawai, pediu-me para lhe mandar as minhas medidas para me poder mandar fazer pijamas num alfaiate chinês que vivia na ilha. Por isso eu respondi enviando-lhe as minhas medidas: 89-60-91 (bons velhos tempos…) O meu marido recebeu a carta, mas as medidas tinham sido riscadas pelos homens da censura que pensaram que eu estava a tentar comunicar com ele através de um código secreto. De qualquer forma, o pijama serviu-me perfeitamente.

Em novembro de 1945, com o terminar da guerra, o meu marido regressou finalmente a casa. Não nos víamos desde que ele tinha partido há mais de dois anos e quatro meses. Durante todo esse tempo só tínhamos falado um com o outro uma vez, pelo telefone. Mas, como tínhamos mantido fielmente a nossa promessa de nos escrevermos todos os dias, cada um de nós tinha escrito ao outro 858 cartas — um total de 1716 que nos tinham ajudado a passar a guerra.
Quando o meu marido regressou, tivemos a sorte de conseguir um minúsculo apartamento no difícil mercado imobiliário de São Francisco. Nesse apartamento, que mais parecia uma caixa, mal havia espaço para os dois, e vimo-nos obrigados, para nosso grande desgosto, a deitar fora as cartas.
Depois de a guerra terminar, tivemos a sorte de nunca mais nos separarmos por mais de dois dias, por isso nunca mais tivemos oportunidade de escrever cartas um ao outro.

Mas, durante todos estes anos, o meu marido tem continuado a mostrar-me a mim, aos nossos filhos e aos nossos netos a devoção e o amor que me demonstrou naqueles primeiros dias.
Acabamos de celebrar o nosso 53. ° aniversário de um casamento feliz, e, embora as cartas dos nossos primeiros anos de casados já não existam, o amor contido nelas estará para sempre gravado nos nossos corações.

Louise Shimoff

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